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Os brutos também amam

O dia que eu fui acionado para resgatar as cartas de amor escritas por Chuck Norris

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Amigos, eu não sei se vocês já desconfiaram, mas além de escritor, comedor compulsivo de temakis e mestre em inventar desculpas mirabolantes para não ir à academia, sou também um agente secreto. Eu “era” um agente secreto, melhor dizendo, porque certamente vão me desligar da corporação assim que esta confissão for publicada no AreaH. Ou, na pior das hipóteses, vão cortar os freios do meu carro, injetar um pouco de heroína em minha corrente sanguínea, escrever um bilhete sem nexo com a minha letra e... bom, vocês já podem imaginar o fim da história. 

O fato é que eu preciso revelar ao mundo o que descobri em minha última missão. E nada vai me parar!

Tudo começou no dia sete de dezembro, quando uma pizza com a borda recheada de cartões de memória chegou até o meu apê. “Pizza com a borda recheada de cartões de memória?”, você deve estar se perguntando, por conhecer apenas bordas recheadas de Catupiry, cheddar ou outra gororoba que faz mal ao coração. É, irmão, exatamente o que você acabou de ler. A corporação adora me passar instruções de maneiras inusitadas e imprevisíveis. Eu nunca sei como as minhas próximas ordens virão. Para você ter uma noção da criatividade dos mensageiros da corporação, uma vez uma pomba defecou um pendrive sobre o meu açaí, no Ibirapuera. 

Mas vamos voltar à pizza e às informações sigilosas que ela me trouxe: “Missão Chuck Norris Z”, foram as primeiras palavras que surgiram na tela do meu computador quando eu, finalmente, consegui descriptografar o conteúdo do cartão de memória 1. O porquê do “Chuck Norris” vocês logo entenderão. “Mas e o ‘Z’, qual o sentido?”, vocês devem estar se perguntando. Eu explico: “Z” porque do “A” ao “Y”, sucessivamente, todos os agentes anteriores falharam, ou seja, foram eliminados pelo alvo, o Chuck Fucking Norris.

“Agente ‘Suricato Sorrateiro’, temos fortes indícios para crer que o Chuck Norris, o mais durão dos homens – mais até do que o Alexandre Frota em cena -, já escreveu cartas de amor e que ele as guarda - a sete chaves, dezoito dinamites e vinte rifles - no porão da casa dele, em Oklahoma. Sua missão é ir até o local (veja o mapa contido no cartão de memória 2), fotografar as cartas, enviá-las para o e-mail marciagoldsmith@gmail.com e voltar antes do Natal. Suas passagens aéreas, vouchers de hospedagem e coordenadas para achar o seu novo passaporte estão no cartão de memória 3. Você assumirá a identidade do Ramón Sanchez, bodypiercer que foi recentemente contratado pelo Chuck para colocar uma argola no pênis dele. O furo deveria ter sido feito ontem, mas demos um jeito de sumir com o Ramón e remarcar a sessão para o próximo dia 10, ou seja, comece a sua preparação imediatamente. Outra coisa: para ficar mais parecido com o Ramón original, você precisará de dois piercings na sobrancelha direita, um no nariz (septo) e um no lábio inferior (lado esquerdo), por isso, deverá passar no SampaInk ainda hoje, às 18h00. Boa sorte”,  foi exatamente assim que a corporação me instruiu. Foda, né? Pensei o mesmo quando li. Mas fazer o quê, irmão? Acha que dá para pagar todas as contas sendo apenas escritor? Já viu o preço do pão na chapa aqui em São Paulo? Tem ideia de quantos livros eu preciso vender para sustentar meu vício em paletas mexicanas? Então aceitei o job, mais uma vez.

Meu primeiro grande obstáculo foi a minha namorada. Ou acha que foi fácil explicar a mudança radical e repentina no meu visual? Como não levar um pé na bunda depois de quatro argolas na cara e um bigodão? Como eu fiz? Liguei para ela e disse que estava comendo a Paulinha, melhor amiga dela, e, quando ela já estava quase sem voz de tanto berrar, eu falei: Brincadeira, amor! Apenas fiz uns piercings e deixei um belo bigode, só para dar uma mudada no visual. Ah, eu também comprei um par de sapatos (da Christian Louboutin) para ela, pra amansá-la de jeito. Depois inventei que uma editora gringa estava me sondando e que eu faria uma reunião nos EUA. E para lá eu fui.

O Chuck mora em uma casa grande e assustadoramente verde. Um verde militar. E, ao invés de cachorros, ele tem tigres brancos e ursos pardos soltos no quintal. Mas como a minha presença já era esperada, bastou tocar a campainha e dizer “Hello! Let´smake a hole in your dick!”. Quanto ao meu sotaque, ele nem desconfiou. Ou acha que um cara chamado Ramón Sanchez nasceu nos EUA? Depois disso, pedi para o Chuck tirar a roupa e deitar sobre a maca que eu havia levado. Aí ficou fácil: aproveitei o furo na piroca do cara para sedá-lo. Sou esperto, né? E usei um sonífero para tiranossauro para garantir que eu teria tempo suficiente para achar as cartas e fugir dali com vida.

Corri para o porão e lá, em meio a crânios humanos, sacos de pólvora e filmes de zoofilia, encontrei uma carta. Uma carta de amor escrita com sangue ao invés de tinta. Mas, ainda sim, tratava-se de uma carta de amor. Bonita, por sinal. À moda dele, não vou negar. Mas bela. Então fiz as fotos e logo mandei o material ao e-mail da Márcia Goldsmith, que logo exibirá o conteúdo no primeiro episódio de um novo programa, Os Brutos Também Amam.

Querem saber o que estava escrito na carta e não querem assistir à estreia do novo programa da Márcia, acertei? Aí vai a tradução da carta, caros leitores:

“Querida Granadinha (só eu sei o quando você gosta de ser chamada assim),

Não consigo me esquecer do dia em que nos conhecemos naquele bar do Texas: lembro-me, perfeitamente, de você disparando sorrisos em minha direção enquanto eu, armado apenas com dois nachos e meio burrito, abatia perigosos soldados do mais temido cartel mexicano, o Los Ossos. Foi lindo, não foi? Eu cortando as artérias daqueles malditos bebedores de tequila e você, como sempre, encantada com a potência e precisão dos meus golpes.

E o nosso primeiro beijo, hein? Consegue recordá-lo? Sua língua sem querer escapou por um buraco de bala que havia em minha bochecha, fazendo com que você caísse na gargalhada.Depois, para impressionar ainda mais, eu enchi a boca de gasolina e jorrei combustível bochecha afora. Aí você aplaudiu e, finalmente, sentiu-se ao lado de um homem de verdade, pois os seus antigos namorados nunca passaram de frouxos que desmaiam por besteiras como fêmures quebrados, bacias descoladas e encontros inesperados com tubarões brancos famintos.

Você é muito especial, sabia? Que outra mulher não se importaria em se casar no Vietnam, ao som de morteiros e explosões? Só você, minha Granadinha. Só você para compreender - sem fazer escândalo ou ameaçar terminar tudo - o meu sumiço de três dias em plena Lua de Mel. Você entendeu o meu desaparecimento abrupto e, diferente de outras mulheres que passaram em minha vida, acreditou em minha explicação. Quando eu finalmente consegui dar cabo em meus torturadores e escapar daquele cativeiro imundo, eu corri para seus braços e disse: “Granadinha, eu fui sequestrado por vietnamitas, mas agora estou de volta, pronto para matar você de prazer!”. E você apenas suspirou alto quando eu, com apenas um puxão, dividi sua calça jeans em duas. E gemeu quando percebeu que nenhum eletrochoque é capaz de abalar a saúde os meus testículos.

Obrigado, Granadinha. Obrigado pelas tantas vezes que você me costurou quando eu fui atingido por balas de fuzil, trens desgovernados, misseis teleguiadose destroços de pontes. Obrigado pelos maravilhosos piqueniques que fizemos sobre campos minados, por ter confiado em mim quando eu disse que apenas um paraquedas seria suficiente para nós e por ter pousado aquele caça quando eu perdi a consciência.

‘Por trás de um grande homem, sempre há uma grande mulher’, não é isso que dizem? E é a mais pura verdade, Granadinha. Sem você eu seria apenas um soldado treinado para matar vilões e desarmar bombas nucleares, porém, graças a você, hoje sou bem mais: sou um soldado apaixonado e, também, treinado para matar vilões e desarmar bombas nucleares.

Eu amo você. E amarei até o dia da sua morte, pois, como você já deve prever, obviamente morrerá antes de mim.

Com carinho, Chuck Norris”

Não é romântico? 

Eu achei.

Ou só é possível demonstrar amor através de rosas, poemas e apelidos “afofurados”?


Ricardo Coiro